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sexta-feira, janeiro 20, 2006
Sou dos que defendem um presidente interveniente. Árbitro, sim, mas com capacidade de parar o jogo e mostrar cartões. Não quero Cavaco como presidente, não por pensar que ele será mais interveniente que os outros, mas porque estou certo que não concordarei com a maior parte das suas intervenções. A esquerda parece-me ter-se concentrado mais em diminuir o papel interventivo do presidente do que a iluminar as diferenças da intervenção.

Sendo uma eleição pessoal, a pessoa que ocupa o lugar de presidente da república deve ser visto como uma pessoa inteligente, competente, diplomata, independente (não necessariamente apartidário) e bem intencionada.

Nesse aspecto o acto de Mário Soares entregar o cartão de militante do PS na sua primeira eleição, enquadra-se no espírito da época em que o presidente até ali independente e apartidário tinha acabado de criar um partido. Também então Soares se candidatou contra um candidato único da direita e um outro candidato do seu próprio partido.
Já Sampaio, que se candidatou contra Cavaco, recusou entregar o seu cartão. Não só porque se candidatava contra alguém altamente identificado com o PSD, mas porque a sua carreira na câmara de Lisboa provava as qualidades acima descritas (sendo a recente história da CML a prova da necessidade dessa qualidades para atingir o acordo entre a esquerda).

Nesta eleição surgem três candidatos que acumulam o papel de líder dos partidos que os apoiam. Se o presidente não tem que ser necessariamente apartidário, também não pode ser candidato a primeiro-ministro nas próximas eleições. São candidaturas apenas relevantes ao nível partidário, cujo objectivo é fazer passar a visão governativa do partido para o país. A vantagem de o fazer numas eleições presidenciais é a ausência dos partidos centrais deste debate governativo, escondidos como estão por detrás dos seus candidatos. Nesse aspecto são candidaturas eficazes para elevar o perfil destes candidatos a primeiro-ministro.

Já Cavaco tenta passar como independente dos partidos - tendo até recusado aparecer num cartaz com Santana Lopes nas últimas eleições legislativas. Ver Cavaco como independente dos partidos, ou por outra, do PSD seria como ver o Pinto da Costa a candidatar-se a presidente da Liga para ser presidente de todos os clubes. Além disso Cavaco apresenta outros sinais preocupantes. Segundo ele próprio, "nunca se engana e raramente tem dúvidas" e acredita que "duas pessoas sérias com a mesma informação têm de concordar". O que demonstra a facilidade de governar um país quando se tem um ser tão brilhante à frente.

Soares, entretanto, não resistiu ao chamamento [de quem?] e avançou. Há que admirar-se a sua energia e a sua determinação. Também há que admitir que se pensou que seria mais fácil; que, somente o peso do seu nome não foi suficiente para a vaga de fundo que obrigaria a uma segunda volta. Ora o facto de alguém que, com a vantagem de provas dadas e com o apoio do partido governamental detentor de maioria absoluta, é incapaz de garantir (pelo menos) uma segunda volta representa um clamoroso falhanço que debilitará um eventual mandato.

Surpreendentemente, Alegre manteve-se à tona d'água. Sem apoios partidários, conseguiu até manter-se a par do "imbatível" Soares. Sem ter que seguir uma linha partidária, e tratando de se distinguir dos oponentes, enveredou pela linha literário-poética de "a língua portuguesa é a minha pátria" e a sua essencial defesa - defesa da pátria ou da língua é que não percebi bem. Também recorreu ao perfil republicano e ao lema da revolução francesa. Tudo coisas que eu até valoro mas as quais, pelo excesso de insistência, podem levar a interpretações nacionalistas, por mais bacocas que sejam.

Decisão


Chegado o momento da decisão vejo-me perante 3 líderes partidários, 1 tecnocrata infalível, 1 monarca governamental e 1 republicano independente.
Não espantará ninguém que exclua à partida o gajo infalível, e que, por muita simpatia que sinta pelas suas pessoas e ideias, os chefes partidários também não recolham o meu voto.

Entre o monarca e o republicano, escolho o republicano; entre o governante e o tribuno, escolho o tribuno; entre o apoiado e o desapoiado, escolho o desapoiado; entre o advogado e o poeta, escolho o poeta; a verdade é esta:

voto Alegre,
mas não satisfeito.

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